“Não te é lícito!” (João Batista, conforme Marcos 6, 18)

Dom José Ionilton Lisboa de Oliveira
Bispo de Itacoatiara (AM)

No dia 29 de agosto celebramos a memória do Martírio de João Batista. Era o segundo dia do Encontro dos Bispos da Amazônia brasileira em Icoaraci, Belém, Pará, para o estudo do Instrumento de Trabalho para o Sínodo da Amazônia. Na celebração da Eucaristia lembramos de alguns Mártires, mulheres e homens que morreram em defesa da Amazônia, seus povos, suas culturas, sua floresta, seus rios, seus territórios.

A III parte do Instrumento de Trabalho tem como tema: Igreja Profética na Amazônia: desafios e esperanças. O papel profético da Igreja e a promoção humana integral é o tema do VIII capítulo desta terceira parte. O número 145 do Instrumento de Trabalho afirma: “Ser Igreja na Amazônia de maneira realista, significa levantar profeticamente o problema do poder, porque nesta região o povo não tem possibilidade de fazer valer seus direitos… Questionar o poder na defesa do território e dos direitos humanos significa arriscar a vida, abrindo caminho de cruz e martírio”.

O Instrumento de Trabalho declara que a Igreja na Amazônia precisa levantar profeticamente a voz, como fez João Batista muito tempo antes de nós, antes da Igreja receber a missão de Jesus de sair anunciando o Evangelho e construindo o Reino de Deus. João corajosamente enfrentou Herodes e denunciou que não lhe era lícito tomar a mulher de seu irmão.

Veio-me na meditação do evangelho do dia, a vontade de escrever um pequeno artigo, buscando trazer para nossa realidade eclesial e social do Brasil e especialmente da Amazônia o grito profético de João Batista.

Para quem João Batista diria hoje: “não te é lícito”? Arrisco-me algumas situações e o leitor poderá completar a partir de sua realidade.

Não te é lícito apropriar-se e privatizar os bens da natureza, como por exemplo a água;

Não te é lícito dar concessões as madeireiras para derrubarem nossas árvores e destruir nossa biodiversidade;

Não te é lícito realizar a pesca em nossos rios e lagos de forma predatória, sem respeitar os pescadores artesanais que vivem da pesca;

Não te é lícito implantar hidroelétricas, estradas e ferrovias que destroem nosso bioma;

Não te é lícito queimar nossa floresta e entregar para pessoas e empresas do agronegócio e do latifúndio, para as monoculturas ou para a criação de gado;

Não te é lícito tomar as terras dos povos originários, ribeirinhos e quilombolas para entregar às mineradoras;

Não te é lícito contaminar a terra, as águas e o ar com agrotóxicos;

Não te é lícito criminalizar quem defende a Amazônia, difamando, prendendo ou matando;

Não te é lícito olhar a Amazônia apenas como fonte de lucro, de enriquecimento, sem respeitar o meio ambiente, seus povos e suas culturas;

Não te é lícito…

FONTE: CNBB