Sereis minhas testemunhas

Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro (RJ)

Contemplamos, ó Senhor, vosso cortejo que desfila: é a entrada do meu Deus, do meu rei no Santuário, Aleluia!

Nesta solenidade da Ascensão do Senhor celebramos Cristo que dá à Igreja a missão de deixar-se conduzir pelo Espírito Santo e ser missionária pelo mundo afora. Nessa semana intensificaremos nossa preparação para a solenidade de Pentecostes. Aqui no Brasil e em todo o hemisfério sul, temos a semana de oração pela unidade dos cristãos, que vai do dia 02 ao dia 09 e que tem como tema “Procurarás a Justiça, nada além da justiça (Dt 16, 11-20), tema que vem bastante de acordo com o tema da campanha da fraternidade deste ano. As Igrejas que aceitam o ecumenismo vão procurar rezar nesta intenção. Ao mesmo tempo, neste dia da Ascensão do Senhor, comemoramos o 53º dia Mundial das comunicações sociais, único dia que foi instituído pelo Concílio Vaticano II, com o decreto Inter Mirifica, dia que está relacionado com o envio dado pelo Senhor neste dia de sua ascensão aos céus. O tema desse dia neste ano, escolhido pelo Papa Francisco está ligado a Ef 4, 25: “Somos membros uns dos outros”: “das comunidades de redes sociais à comunidade humana”, lembrando a importância das comunidades de rede que devem ter como função melhorar as comunidades humanas. Dentre tantas coisas, o papa recorda:  “Se é verdade que a internet constitui uma possibilidade extraordinária de acesso ao saber, verdade é também que se revelou como um dos locais mais expostos à desinformação e à distorção consciente e pilotada dos factos e relações interpessoais, a ponto de muitas vezes cair no descrédito”. Nesta semana continuamos a novena ou então iniciamos a semana de preparação para a grande solenidade de Pentecostes. São vários os momentos que hoje e a partir deste final de semana estão presentes para atualizar nossa vivência da fé.

A solenidade da Ascensão do Senhor assinala a entrada definitiva da humanidade de Jesus no domínio celeste de Deus. Tendo entrado uma vez por todos no santuário do céu, Jesus Cristo intercede sem cessar por nós como mediador que nos garante permanentemente a efusão do Espírito Santo. “Hoje nosso Senhor Jesus Cristo subiu ao céu; suba também com ele o nosso coração. Ouçamos as palavras do apóstolo: se ressuscitastes com Cristo, esforçai-vos por alcançar as coisas do alto, onde está Cristo, sentado à direita de Deus; aspirai às coisas celestes e não às coisas terrestres (Col 3, 1-2). E assim como ele subiu aos céus sem se afastar de nós, também nós subimos com ele, embora não se tenha ainda realizado em nosso corpo o que nos está prometido (Dos Sermões de Santo Agostinho, Bispo: Ofício de Leituras da Solenidade da Ascensão do Senhor).

Jesus Cristo, aquele que é a cabeça da Igreja, nos precede no Reino glorioso do Pai para que nós, membros do seu corpo, vivamos na esperança de estarmos um dia eternamente com Ele (Cf. CIC 667). Esta última etapa da vida pública de Jesus permanece intimamente unida à primeira, ou seja, ao evento da Encarnação. Só aquele que “saiu do pai” pode retornar para o Pai, isto é, Cristo. Ninguém jamais desceu do céu, a não ser aquele que desceu do céu, o Filho do Homem (Jo 3, 13).

Entregue às suas forças naturais, a humanidade não tem acesso à casa do Pai, à vida eterna e à felicidade de Deus. Só Cristo pôde abrir esta porta ao homem de sorte que nós, seus membros, tenhamos a esperança de encontrá-lo lá onde Ele, nossa cabeça e nosso princípio, nos precedeu (Cf. CIC. 661).

A primeira leitura nos apresenta o início do livro dos atos dos apóstolos (At 1, 1-11). Lucas liga essa obra com o final do seu Evangelho, mostrando as origens e a primeira expansão do cristianismo, tendo como protagonista o Espírito Santo. Narra as aparições do ressuscitado em 40 dias, retomando as várias referências que o simbolismo do número 40 tem no contexto Bíblico, apresentando uma dimensão salvífica: O dilúvio, a caminhada do êxodo, Moisés no Sinai, Elias, as tentações no deserto, etc. O Senhor corrige a visão de um imediatismo messiânico ao colocar nas mãos dos apóstolos a tarefa de ser testemunhas do Senhor até os confins da terra, pela ação do Espírito Santo.

O relato descreve a subida de Jesus aos céus: temos, em primeiro lugar, a elevação de Jesus ao céu (vers. 9a). A ascensão é uma forma de expressar que a exaltação de Jesus é total e atinge dimensões supra terrenas; é a forma literária de descrever o culminar de uma vida vivida para Deus, que agora reentra na glória da comunhão com o Pai. A Nuvem que encobre Jesus nos faz recordar o simbolismo desta para exprimir a presença do Divino. A nuvem esconde ao mesmo tempo que manifesta: mostra o mistério de Deus escondido e presente ao mesmo tempo, que há de sustentar a caminhada da Igreja por meio da ação do seu Espírito. A conclusão do relato vem com a presença dos dois personagens de branco, recordando aos discípulos que eles agora são os continuadores na história da missão inaugurada por Jesus. A Ascensão de Jesus nos lembra principalmente que Ele foi elevado para junto do Pai e nos encarregou de continuar e tornar realidade seu projeto libertador em meio aos homens.

O Salmo responsorial (Sl 46), é um dos salmos da realeza do Senhor, onde se apresenta um convite de louvor, a todos os povos, ao rei Soberano de toda a terra, ele que se elevou entre aclamações, subiu ao toque da trombeta e está agora sentado em seu trono sagrado.

A segunda leitura (Ef 1, 17-23), mostra como a força de Deus se manifesta na exaltação de Cristo. A leitura começa com uma oração de Paulo para que os destinatários conheçam a esperança a que foram chamados. A prova de que o Pai tem o poder de realizar isso na vida da Igreja é o que ele realizou em Cristo: O ressuscitou, o elevou aos céus e o fez sentar à sua direita. Cristo é apresentado como cabeça da Igreja, mostrando que entre Cristo e a Igreja há uma união indissolúvel, com uma comunhão total de vida e de destino. Cristo é o centro do qual o corpo se articula, a partir do qual o corpo cresce, se orienta e se constrói. O texto também apresenta Cristo como plenitude, Cristo que atrai a si o mundo todo até que seja tudo em todos.

O Evangelho (Lc 24, 46-53) nos apresenta as últimas palavras de Cristo dirigidas aos seus antes de sua subida aos céus e o próprio relato desta subida. O relato da ascensão do Senhor anuncia-nos a Missão da Igreja. Jesus os abençoa e deixa uma promessa: “Vós sois testemunhas disso. Eu vos enviarei Aquele que foi prometido por meu Pai. Por isso, permanecei na cidade, até que sejais revestidos com a força do alto”. Jesus dá aos seus a missão de serem testemunha de tudo o que viram e ouviram, assim como nós, hoje, somos também chamados a ser testemunhas, chamados a ser atualizadores do mistério. Ao mesmo tempo vemos que os discípulos se prostraram diante de Jesus, e depois voltaram para Jerusalém com grande alegria. E estavam continuamente no templo, bendizendo a Deus, alegria esta que é fruto da certeza da presença do Ressuscitado e da ação do Espírito.

Ser testemunhas de Jesus Cristo. Ele ressuscitou e nós o encontramos. Ele nos abençoa e nos envia para sermos suas testemunhas até os confins do mundo. Assim como a palavra de Cristo chegou até nós somos também chamados a fazer com que ela chegue aos outros, muitas vezes aos nossos familiares, àqueles que estão afastados da Igreja, aos vizinhos que estão longe do Senhor, àqueles de nossas cidades que podem estar vivendo uma vida apática ao Evangelho. O Encontro com o Senhor transforma nossas vidas e a ação do Espírito nos impulsiona a ir adiante.

Que saibamos ser unidos para assim anunciarmos o Senhor. Que saibamos utilizar os meios de comunicação para formar redes humanas e comunicar palavras de verdade, pessoas que se amam e se encontram. Que ao rezarmos pela unidade dos cristãos, estejamos abertos à ação do Espírito, cuja festa viveremos na próxima semana, que renova a nossa vida.

Fonte: CNBB